terça-feira, 15 de fevereiro de 2011


Miguel Zugger

De terrorista palestino a batista fervoroso, Miguel Zugger abandona todas as armas e fuzis para pregar sua nova religião em busca da paz.

Ao conversar com Miguel Zugger, 46, é possível se intimidar diante de suas feições rudes, mas quando começa a contar a história da sua vida percebe-se uma expressão de paz nos olhos, que se confundem com os traços fortes e postura firme. Ele é alto, careca e tem o bigode preenchido de fios grisalhos. Sua casa é simples e humilde: um sofá antigo, a mesa central e duas poltronas de couro marrom compõem o ambiente.

Esse é apenas um dos onze nomes que carrega em passaportes falsos. Jurado de morte por uma das facções islâmicas mais temidas, o único objetivo que Miguel mantém há 14 anos é converter os muçulmanos ao cristianismo.

Nascido na cidade de Belém, cerca de cinco quilômetros ao sul de Jerusalém, em Israel, teve a infância marcada pelo ódio e pela guerra. Aos oito anos, já era instruído a sonhar com um estado palestino independente. Aos doze, aprendeu a usar um fuzil. Suas pequenas mãos foram manchadas de sangue quando tirou a vida de um pai de família israelense. Sua brincadeira favorita era pegar as granadas e os restos de balas no chão dos campos de treinamento. Fazia uma fogueira, jogava os restos de armamentos e se escondia atrás do muro para ouvir a explosão. Com a infância roubada, desconhecia o que era ser criança. Também não sabia o que era sorrir.

Miguel começou a odiar o mundo e a lutar pela defesa de sua pátria dentro do ideal pregado pelo terrorismo. Não conseguia compreender porque seu país não era livre. Lutou pelo Estado e almejou uma bandeira para o seu povo, tanto que se dedicou durante seis anos ao estudo da teologia muçulmana, na Palestina. Pregava o islamismo no mundo e passou a ser um dos responsáveis por treinar novos terroristas.


A história de Miguel é marcada por acontecimentos tortuosos. Em 1987, ajudou a fundar uma estrutura que hoje é conhecida como uma das organizações mais perigosas e temidas no mundo: o Hamas. Para ele, hoje é difícil imaginar que treinar jovens líderes e suicidas poderia tornar-se uma realidade tão dura.

A vida de Miguel é envolta de contradições culturais e espirituais. Em dezembro de 1991, aos 33 anos, parte para uma jornada de viagens com o objetivo de pregar o islamismo no mundo - ou o terror, como define sua missão passada. Chegou a receber salários de US$ 15 mil mensais para treinar líderes muçulmanos em diversos continentes, entre eles a Europa e a América do Sul. Vivia clandestinamente buscando destruir aqueles que julgava inimigos, como judeus e cristãos.


Miguel deixou sua terra com o Alcorão - o livro sagrado do muçulmanos -, e um fuzil em suas mãos, com o intuito de propagar sua religião na Argentina, sem saber que ali, na cidade de Rivera, decidiria tomar uma nova diretriz.


Ao passar por uma casa, parecida com uma igreja, ficou intrigado ao ler os dizeres Templo Batista BETEL. Julga ser uma sinagoga. Volta na manhã seguinte para conferir, mas já planejando jogar uma bomba no local. Porém, em seu retorno ao templo, entra e se depara com uma realidade até então desconhecida.

O carinho e a acolhida gratuita que recebe o deixam espantado e, ao mesmo tempo, emocionado. Nesse momento, Miguel se questiona quem seria este Deus que transmite paz àquelas pessoas ao invés de ordens. "Por que as pessoas sorriem para mim, me beijam e me abraçam sem ao menos questionar quem sou, de onde venho e por que estou aqui?"


A única certeza é a de que em 33 anos de prática terrorista, a entrada na Igreja Batista mudou definitivamente o percurso de sua vida. Ainda sem entender a alegria daquelas pessoas, Miguel decidiu procurar um seminarista para saber mais sobre a Bíblia e esse Deus que sua religião e fé estranhavam. Ele não sabe se foi a influência do lugar, mas o fato é que depois do episódio, optou por se converter ao cristianismo. E foi aí o maior desafio: enfrentar a cultura, o povo e o ideal difundido tão arduamente por sua pátria. Transmitir e receber paz ao invés de violência. Aprender a sorrir.


O momento da conversão implica numa transformação radical. Miguel passou a ser perseguido por sua organização. Ao voltar para o hotel onde estava hospedado, encontrou um bilhete em hebraico deixado embaixo da porta. "Nós vimos onde você foi. O que está acontecendo? Estamos espertos com você."


Mas a decisão já estava tomada e o novo cristão deixava seu gordo salário para entrar para o seminário, abdicando de uma conta bancária que já somava US$ 288 mil. A nova fé o fez dividir cama, comida, dinheiro e até mesmo um sabonete durante os quatro anos em que estudou para ser seminarista.

Rejeitado pela família – que a princípio não admitiu a escolha de Miguel – e longe de sua terra, sofria em silêncio, mas estava convicto do novo caminho a cumprir. Em 1996 foi nomeado missionário dos batistas para pregar o evangelho no Oriente Médio.

Ao chegar à terra natal, deparou-se com a pobreza, a fome e as dificuldades de seu povo. Miguel não deixava de querer ver sua terra livre, com uma bandeira e uma identidade, mas agora não sentia ódio do mundo e das pessoas, e sim desejava uma salvação eterna para o povo. Queria fazê-los deixar de sofrer, lutar pela fé e sobrevivência deixando um testemunho de caridade nos lugares em que passava. Mas essa solidariedade lhe rendeu muitas prisões e perseguições.

Preso e torturado mais de 26 vezes – pelo grupo terrorista que ajudou a fundar –, Miguel chegou a ser colocado em poços, "debaixo da terra porque lá não existem prisões comuns," ao lado de bichos e cadáveres, sem água e comida. Mesmo assim, manteve-se fiel à nova causa. "A fé me tornou forte nas piores situações possíveis. Era o caráter de Cristo que se formava, pouco a pouco, perto de sua cruz."

Miguel não desistiu em momento algum. Chegou a comprar muitos exemplares do Alcorão, rasgou-lhes as capas e colou-as no livro do Novo Testamento para que pudesse distribuir clandestinamente em famílias e hospitais. Entre às 11h e 13h - horário em que os muçulmanos não podem abrir o Alcorão por acreditarem que é um momento impuro - era o período diário que possuía para cumprir a missão.

Nas fotos do passado, o bigode de Miguel é o mesmo, só que ainda da cor do cabelo que já não existe mais: negro. Em outra está ao lado de um garoto. Allie é o seu nome. Um menino órfão que tem a trajetória marcada por preconceito e pela violência sexual.

Miguel o encontrou ferido à bala na Faixa de Gaza e deu-lhe todos os cuidados necessários: físicos e espirituais. Allie o adotou como pai até Miguel ser preso novamente. Noves meses depois foi libertado, na Palestina, e saiu atrás do seu "filho". Encontrou Allie em um campo de refugiados. Emocionado, correu para abraçá-lo e ao encostar o corpo contra o seu peito ouviu um grito. Tirou a blusa de Allie e viu o tamanho sofrimento do menino enquanto esteve longe: marcas de facadas e surras por testemunhar sua fé em Cristo. O fato ocorreu em 1997.

Hoje, Allie está com 17 anos e se tornou missionário a exemplo do “pai”. Numa das vezes em que foi preso, em 25 de dezembro de 2002, já casado e com um filho de um ano e meio, Miguel sofreu pela primeira vez o medo da separação. Ela também era muçulmana e se converteu graças ao marido. A fé de Miguel lhe deu conforto e motivação para lutar pela paz. Desde 1999 - ano em que se conheceram -, ela o acompanhava e, mesmo sabendo dos riscos, não desistia.


E foi com determinação que concentrou forças nas orações, pois acreditava que ter o marido de volta era uma questão de tempo. No cárcere, torturado, Miguel pôde escolher entre a vida, negando sua fé, ou a morte como Cristão. Escolheu a morte, mas acreditava que o testemunho de força e coragem traria proteção na prisão entre iraquianos, egípcios e paquistaneses que, admirados por sua crença, pouparam-lhe da morte. "Seria fuzilado. Faltavam poucas horas quando, para o meu espanto, fui levado ao aeroporto para ser expulso do país." E com a esposa e o filho, se viu livre.


Diante de sua cultura e posição civil na sociedade, da luta frente aos costumes e religião, Miguel hoje consegue transmitir serenidade. É difícil perceber em suas mãos que carregam a Bíblia, marcas de granadas e violência. A voz tranqüila, de sotaque carregado, confirma a marca da determinação. Em seu testemunho, um ar de paixão. Uma paixão que é sofrimento, mas que também é entrega.

Miguel hoje viaja pregando o evangelho, pregando o amor. Ainda se esconde, mas nunca se omite. Não se envergonha de sua origem, tão pouco de sua conversão. Aos 46 anos, Miguel Zugger se orgulha da escolha, de partilhar a sua vida marcada por lutas e ideais. Homem forte, hoje não tem o apoio de toda a família, mas se alegra quando ouve a mãe dizer que é “uma cristã muçulmana”. Com a religião sempre presente em sua vida, Miguel agora quer estar além dela. “Não tenho saudade de voltar a ganhar US$ 15 mil por mês. Hoje durmo sem fuzil, abraçado com meu filho. Ele agora está com três anos, estudando. E vou até onde nosso Deus permitir."

4 comentários:

  1. Em Nome de Jesus !!! O trabalho desse missionário é de extremo perigo e requer sigilo absoluto sobre sua identidade. A citacão do nome e mesmo as iniciais verdadeiras colocam-no à mercê dos que intentam contra sua vida. Sugiro que se troque o nome por um fictício, bem como suas iniciais. A contar da data da publicação, 2008, quem me garante que alguma de suas inúmeras prisões e aflições não tenham sido causadas pela divulgação irresponsável do seu nome no livro ou em Blogs como esse, ainda que com boas intenções ?

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  2. Valeu Will!!! Acontece que Miguel Zugger já é o nome fictício.

    Além disso, quando ele esteve na Batista Getsêmani, no congresso Loucos por Jesus, o nome M.Z. foi divulgado junto com a divulgação do evento.

    Abraço.

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  3. Esse é apenas um dos onze nomes que carrega em passaportes falsos. Jurado de morte por uma das facções islâmicas mais temidas, o único objetivo que Miguel mantém há 14 anos é converter os muçulmanos ao cristianismo.

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